Bactéria em casa de bombas da Trensurb estaria causando cheiro e gosto ruins na água de Porto Alegre
Foi pelo olfato que funcionários de fiscalização da Fundação Estadual de Proteção Ambiental ( Fepam ) se guiaram para chegar àquela que pode ser a fonte do cheiro e do gosto ruim que persistem na água em Porto Alegre há mais de um mês . Percorrendo locais por onde passa o tratamento na cidade, eles chegaram a uma estação de bombeamento da Trensurb, localizada próxima à Ponte do Guaíba, que pode estar servindo de abrigo para a proliferação de bactérias que, segundo eles, explicariam a origem do problema.
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O cheiro parece impregnar o lugar. A casa de bombas, conforme profissionais da Trensurb que trabalham ali, deveria receber somente água pluvial (da chuva), que sai dos arredores da central, vai para o Guaíba e, posteriormente, é tratada. Mas a estação, que funciona ininterruptamente para evitar alagamento nos trilhos, tem recebido também esgoto doméstico e resíduos industriais, o que, aliado à falta de chuva, contribuiria para a formação das bactérias, segundo a Fepam.
— O que pode ter acontecido nesses meses: se desenvolveu uma bactéria diferente do normal, e é ela que está nos causando tudo isso. Esses actinomicetos (bactérias que se desenvolvem em locais ricos em nutrientes, como onde existe água parada) aparecem volta e meia em todas as estações de tratamento de água do mundo. Temos certeza de que eles não fazem mal à saúde, mas dão esse gosto e esse odor à água — diz Renato João Zucchetti, chefe do departamento de fiscalização da Fepam.
Local que faz bombeamento para que os trilhos da Trensurb não passem por alagamentos chamou atenção pelo cheiro Foto: Carlos Macedo / Agencia RBSA descoberta, por enquanto, não passa de uma hipótese para explicar o problema, mas é possível que as bactérias estejam sendo levadas com a água que é bombeada para o Guaíba e, dali, passando pelo tratamento do Departamento Municipal de Água e Esgotos ( Dmae ), que não tem conseguido fazer a "purificação". A concentração dessas bactérias na estação da Trensurb, identificada em uma análise concluída no início de junho, surpreendeu os fiscais: foram encontrados 35 milhões de actinomicetos por mililitro de água, número considerado muito alto.
A suspeita, contudo, só veio agora porque a fiscalização do órgão começou a visitar cada um dos locais por onde passa a água que acaba chegando às torneiras. Nas estações próximas da Rodoviária e em uma empresa de tratamento de efluentes líquidos, nada foi detectado, mas a central de bombeamento da Trensurb apresentou o cheiro característico e, a partir disso, a Fepam passou a desconfiar da proliferação de bactérias.
A falta de chuva em Porto Alegre nos últimos meses estaria contribuindo para o problema. Segundo Zucchetti, a presença de esgoto e resíduos industriais no local, adaptado para bombear águas pluviais, seria determinante. Sem chuva, a água que revolve em meio às seis bombas da Trensurb fica muito mais suja.
— Se a água estivesse corrente, elas não se formariam.
Trabalhando no local desde sua criação, há 32 anos, o técnico mecânico da Trensurb Sérgio Silvestre disse que só havia recebido fiscais da Fepam no local uma única vez antes. Mesmo em outras épocas de estiagem, lembra ele, tal suspeita nunca havia sido levantada.
Uso de rede pluvial vira jogo de empurra entre departamentos
A explicação sobre o porquê de a rede pluvial estar sendo utilizada para escoamento do esgoto na região passa por pelo menos três departamentos da prefeitura, mas nenhum conseguiu dar uma resposta definitiva.
O uso da rede pluvial para despejo de esgoto doméstico e resíduos industriais não é ilegal, como explica o Departamento de Esgotos Pluviais (DEP). Mas isso deve ocorrer somente quando não há rede cloacal disponível no local. O problema é que, conforme a assessoria de imprensa do Dmae, essa rede cloacal existe na área do bairro Navegantes onde fica a casa de bombas da Trensurb.
Suspeita-se que os efluentes de indústrias que operam próximas à Ponte do Guaíba possam ser, ao menos parcialmente, responsáveis pela proliferação de bactérias, cuja origem ainda não foi descoberta. Essas empresas teriam autorização da Fepam para despejar esgoto na rede pluvial que chega à estação da Trensurb, mas deveriam fazê-lo somente após realizar um tratamento prévio desses resíduos.
Os departamentos envolvidos na investigação agora aguardam o resultado de testes que podem confirmar a suspeita ou manter o mistério. Amostras da água foram enviadas a São Paulo, onde passam por um escrutínio químico que pode ser capaz de apontar, em um nível de detalhamento maior do que o oferecido pelo Dmae, os componentes envolvidos no odor e no gosto da água porto-alegrense. Os resultados devem sair em cerca de 10 dias.
Caso a hipótese seja confirmada, a Fepam estuda de que maneira pode "limpar" o local. O uso de caminhões-pipa, de uma bomba externa para tirar a água com bactérias e o tratamento com químicos feito diretamente no local são algumas das sugestões apontadas.
* Zero Hora